domingo, 25 de maio de 2008

25 de maio

A dor ainda é a mesma.

A mesma intensidade.

O mesmo vazio e a mesma incompreensão ainda fazem morada no peito.

Há onze anos, também era um domingo. Também uma manhã ensolarada.

Um 25 de maio que ganharia contornos de tristeza.

A casa de repente ficou cheia de pessoas.

Misturavam-se o choro, o abraço, as perguntas, e, os agora?

A cabeça latejava. A mente fervilhava a procura de respostas.

O nervosismo e o pânico pediam um trago de cigarro. E foi com essa justificativa que ela saiu daquela sala.

Com essa desculpa ela ganhou a porta da rua para apagar aquela visão.

-To indo comprar cigarro.

Os amigos seguiram-na. Num cortejo silencioso. Contemplando a cadencia do corpo daquela menina, que mesmo forte e equilibrada, parecia que desabaria a qualquer instante.

Eles carregavam no peito o medo do que o desespero dela poderia ordenar. Tinham medo de perdê-la naquela manhã.

Compraram cigarros para ela.

Fumou. E fumou outro. Mais outro.

E chorou.

Não tinha coragem de erguer a cabeça. De encarar os amigos.

Tinha medo de lembrar o porquê a cabeça doía. E então fumava.

No retorno, o cortejo a seguia apenas observando. Temerosos.

Se ela caísse, eles estariam lá. Esse era o acordo tácito. Esse era o pacto.

Voltaram para sala. Ela e os amigos. E os outros começaram a partir.

O silencio agora era o dono daquele lugar. Só corpos mudos esperando a ordem.

Finalmente um homem quebrou aquela mudez. Declarou que o medico já assinou o atestado de óbito e o velório dentro de uma hora começaria.

Enquanto ela chorava, o homem ainda deu ordem para que se aprontasse.

Os amigos partiram com a promessa de encontrarem-se lá.

Ele ficou. Mudo. Sentado ao lado dela. Apenas presente para ela.

Ela, enfim, desabou no sofá.

Quando percebeu, estava fumando em frente do cemitério. Quando percebeu que ele segurava sua mão, viu que era verdade.

Ao seu corpo então foi arremessado toda aquela sensação que deu inicio a manhã de domingo. E aquele 25 de maio inaugurado com a visão daquele corpo tombando diante dos seus olhos, tatuou no corpo daquela garota de 17 anos a dor do morrer.

3 comentários:

  1. Tristeza poética.


    http://pulchro.blogspot.com/

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  2. Tive um dia assim também, foi um 29de março, faz 4 anos já e no dia comentei que nunca mais me esqueceria desta data, impossível.
    Fiz um texto pra ela num dia de muita saudade, chama-se 'Dengo', mas foi minha forma de dizer que sinto muita falta dela ainda.
    Espero que o seu outro dia tenha sido mais ensolarado e que tenha encontrado algum sentido pra isso tudo...
    E sim, acho que a vida é um dejàvu ou uma mistura de gentes passando pelo mesmo processo de descoberta, cada um no seu tempo, mas é tudo muito parecido!!

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  3. Pulcro, é tristeza, só não sei se tem poesia mesmo.
    É verdade Vanessa, todos se parecem em muitas coisas, só nós esquecemos disso em alguns momentos.
    Depois eu passo lá pra conferir "Dengo".

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